sábado, agosto 08, 2009

Aquela esquina vazia

Ando e ando
Não importa o quanto avance
Aquela esquina que um dia tinha você
Aquela esquina
Da cidade onde moro
Hoje não tem mais ninguém
Só rostos que se repetem na estranheza dos dias
E na vastidão das passagens das semanas
Dos meses
Essa mochila já não é mais a mesma
As idéias não são as mesmas
As festas não são as mesmas
Por isso nem eu sou mais o mesmo
Os passos já não caminham para os mesmos lugares
Os amigos não moram logo ali
E essa saudade que teima
E me consome
E me vence todos os dias
Os finais de semanas solitários
Cercado de uma multidão
Aquela mulher maravilhosa que vi hoje no ponto
Perto daquela loja
Nunca mais vou ver em toda a minha vida
Não há mais lugares comuns
Os pés não se firmam no chão
O ar queima meus pulmões
Não vejo, nem sinto cheiro da terra
A terra ainda existe debaixo de todo esse concreto?
A humanidade existe debaixo de toda essa impessoalidade?
Quanto tempo vou resistir?
Quanto tempo vou existir?
Ainda existo?
Engrenagens não tem vontade própria
Quando eu era alguém
Porque alguns me conheciam
Achava tudo chato
Achava tudo sofrido
Agora, no meio desse vazio populoso
Apenas procuro você
Meu amigo
Naquela esquina distante
Que eu nunca alcanço
Mas que provavelmente ainda está lá
Fui eu que mudei
De perto daquela esquina que eu era alguém

Velho e encardido

Mais um dia
Mais um louco aqui nesse gabinete
E eu velho professor
De que me vale a maturidade
A experiência
Se minha velha cabeça já não funciona como antes
Sou só mais um...
Mais um velho que as pessoas respeitam
Mas elas me respeitam pelas coisas que fiz enquanto jovem
Curioso um velho ser respeitado pela juventude que a muito já se foi
Mas eu permaneço aqui
Apodrecendo enquanto o tempo não se cansa de mim
O que quer aluno?
Ávido de perguntas vazias?
Cujas respostas já as tem
Ou as pode ter com facilidade?
És tão vazio quanto eu já fui
E serás tão enferrujado quanto sou
Só me resta escutar as suas asneiras
É função dos velhos
Professor, como o senhor mesmo disse...
Blá, blá, blá...
E o marxismo...
Blá, blá, blá...
Mas o Weber...
Blá, blá, blá...
E a história cultural...
Blá, blá, blá...
Eu queria pesquisar a história das mulas na América pré-colombiana
Vinculada com o neo-colonialismo
E a expansão neonazista fatigada do século XXI
E acho que a fonte poderia ser a Wikipédia
Ou qualquer outra coisa fácil de se achar, ler e entender
Sim, acho isso tudo muito produtivo
Tudo muito relevante
A sociedade atual permite pensar muita coisa à respeito destes assunto
Inclusive mulas neonazistas fatigadas
Mas, como eu já disse em sala de aula
E você fez questão de repetir tudo aqui
Num exercício fantástico de memória
E de chatice discente
Isso é coisa não pra historiador
Acho que isso nem mesmo seria científico
Talvez um livro de ficção
Uma pornoxanxada
Ou um especial de fim de ano na tv aberta
Mas, infelizmente para o seu ímpeto criativo
Não passa de delírio
Aliás, e como anda sua transferência?
Há outros cursos mais informativos que poderiam aproveitar sua imaginação